segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Fantasmagorias

Poesia de
Wallace Monjardim Bonini


"[...] mostrar-te-ei a condenação da grande prostituta que está assentada sobre muitas águas,
2 com a qual se prostituíram os reis da terra; e os que habitam na terra se embebedaram com o vinho da sua prostituição." [Ap 17:1,2]


Canto Primeiro
"AS ASAS NEGRAS DO ESTRO"

I
Ouça! Rasga do vale de minh'alma
O meu estro sangrento e renitente,
Visões que germinam da vasta angústia,
Cólera ardente... e gritos... e prantos!...

Trovejam gemidos de sofrimento
Versos cor de chumbo da tempestade,
Não cabem cá dentro - vingam e fogem
Sem destino exato vão pelo mundo.

II
Vão pela noite, zanzando, à procura
Dos homens que deploram injustiças;
Das línguas que não expressam mentiras;
Das mentes que a sabedoria alveja.

Vão! Mas ao encontro de suas casas.
Que o vento lhes rocem como as folhagens
E deitem-se ao colo da sentinela;
Que beijem o sol que no seio pulsa.

III
Ouça o meu canto de Lúcida Febre!
Suba na torre e sofra suas dores,
Porque nesse escarro em mar de poesias
A lira do amor na ira se enterra.

Ouça-me também cavaleiro errante!
Monte o corcel dos meus sóbrios clamores
E respire fundo as frouxas essências
Das murchas Flores em lenha candente.

IV
Meu canto é morto, não ri-se nem rima,
Sem inteligência do mestraço ilustre;
É uma carruagem seguindo sem freio
De ladeira abaixo ao leito da lama.

Mas, não! Ainda do espelho não mine
Nem uma gota de lamentação
Antes de ouvir entoar dos acordes
A marcha fúnebre do último século.

V
Ouça os louvores ao Terceto Eterno!
Canções perfeitas de sábias palavras.
Ouça Sua voz de justiça e verdade,
A estrela que a escuridão desconhece.

Beba da fonte de sua Escritura,
Nasce no choro do arrependimento.
Provarás da traça que me devora
E verás o oculto atrás do belo.

VI
Do lago límpido de águas serenas
Tem-se a paisagem anil montanhosa
Que esconde dos olhos, já seduzidos,
O gozo em chamas do vulcão inflame.

Vamos, acorde! Meu povo, acorde!
Que a rosa se abriu para um novo dia.
Transpire a fragrância do amor sincero
E feche os seus olhos pra face externa.

VII
Os ramos têm pressa a se renovarem
E as folhas já brotam - vem o verão!
Permita que o pranto enxague seu peito
Dessa contaminação secular.

Ouça, meu amor! Esses meus anseios
Têm por açoite o meu triste Lamento,
Como as corujas que encerram a noite
E ressonam sob um sol quase ausente.


Canto Segundo
"A IMAGEM DA BESTA"

VIII
Aponta no extremo um manto de trevas
Uma abominável face sombria,
E, nos seus braços, deita a ventania:
Arrasta o que vê e deixa o estrago.

A fúria devasta sem piedade,
Ao próprio destino - A perdição!
A voragem assola o berço do espírito
Ficando um talho profundo e aberto.

IX
Com beijos e abraços junto à procela
Das águas surgem bestas emergentes
trazendo em suas mãos as taças de ódio
Ofertando ao povo o veneno amargo.

Os seus nomes gritam cegos e enfermos,
Pois embriagados de suja doença.
Se enchem da satisfação da borrasca
Em meio às desgraças, entre as ruínas...

X
Tão certos de si se vão ao abismo
Inúmeros homens de olhos vendados,
E os promotores de tristeza e guerra
Dão gargalhadas a cada vitória.

Alguns demônios vestidos de reis
Prometem trazer alegria e paz,
Se fazem cordeiros - Bravos discursos!
Distraindo os homens das Leis de Deus.

XI
A imagem do dito lago de fogo
É venerada nas quatro estações.
D'aqueles que vivem pelos palácios
Àqueles que nem têm onde viver.

Sorve a inocência a traiçoeira astúcia,
O mal se apodera da ingenuidade.
Desviam-se da conduta moral
Sendo a evasiva a modernização.

XII
Aos olhos dos bobos é núpcia eterna
Um engenhoso colégio de sombras
Com gênios doutores determinados
A prostituir seus admiradores.

Sua face mina a fornicação
E estratagemas do dom de mentir;
Dos lábios de muitos homens sem brilho
A tolice ganha cultos de glória.

XIII
A imagem é o coração da desonra,
Não dorme e não cansa-se de enganar.
Se vivifica nos cursos elétricos
Qu'homens custeiam por prova de amor.

E assim se firma sua companheira,
Ergue a idolatria e falsa emoção.
Se lança um osso vão todos atrás
E o Livro da Lei cai no esquecimento.

XIV
Prepare-se irmão! Rastela a sentença.
Pois já se secaram galhos e folhas;
Pois n'espera anseia a grande fornalha;
Que a face da terra agora desflora.

Prepare-se irmão, prepare-se já!
Porque beleza se traduz em farsa
E as mãos sedosas que afagam seu rosto
São as mesmas que açoitam suas costas.

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