quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Peregrinação: Capítulo II

ALÉM DA FRONTEIRA

Quando Fernando cruzou os limites do país onde o decreto sanguinário vigorava, a noite obumbrava as terras e matas que surgiam. Um tênue brilho estelar clareava no silêncio as folhagens verde-escuras das árvores numerosas. Nem pássaro cantava, nem vento gemia. Ouvia-se apenas o manso caminhar de algum ribeiro, serpenteando pela estranha terra, bem próximo dali.

Fernando então escutou o crepitar de galhos secos junto à vereda em que seguia e interrompeu os passos bruscamente. A polícia nacional estava à procura dos fugitivos para fazê-los regressar ao jugo do decreto e puni-los severamente pela desobediência, pela rebeldia, pela traição. Todos os trabalhadores que tiveram a ousadia de levantar-se contra a palavra do príncipe deveriam sofrer duplamente as punições da potente mão de ferro do governo. A inteligentíssima e disciplinada guarda nacional os encontraria certamente. A fúria do governador lhes forneceria toda a necessária motivação para isso.

Do lado oposto da vereda, próximo à outra borda do caminho, surgiu um farfalhar de folhas pelo chão. Alguém parecia caminhar por ali também. Fernando escutava os passos aproximarem-se de si numa constância pressurosa e o seu coração saltava fortemente dentro do peito. Ser capturado agora seria pior do que a morte? Realmente sim. Não tanto pelo claustro nem muito pela tortura dolorosa e todo seu amargo sofrimento, mas pelo distanciamento eterno da pátria amada. Privassem Fernando da liberdade física e lhe causassem muitas dores de tortura, o sonho esperançoso da feliz morada lhe encheria os sentimentos daquela virtude poderosa que capacita a suportar as adversidades e tribulações e condiciona a recomeçar sempre tudo novamente. Tirem tudo de Fernando, mas lhe deixem a esperança, e outra vez se erguerá das cinzas e do pó para bradar inda mais forte o nome imenso da sua pátria. Parece inútil tentar tirar-lhe a esperança. Fernando guarda o coração, por isso permanece caminhando. Assim, pela confiança de alcançar a pátria alegre, estava disposto a defender-se dos inimigos com todo o seu vigor. Fechava os punhos para o combate. Alternava o olhar para ambos os lados do caminho. Não enxergava nada de anormal, ouvia apenas o som das folhas e o estalar dos galhos, quando um grito poderoso de comando bradou de repente e num brevíssimo instante os passos das duas margens da vereda precipitaram-se velozmente em sua direção. Fernando, assustado, sentiu uma pancada dolorosa na cabeça, vagamente pode ver um rosto de pessoa à sua frente, e logo desmaiou.

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